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“O adoecimento mental faz parte de uma profissão de risco”, alerta especialista

Há 5 anos


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Homens e mulheres que atuam nas forças de segurança, muitas vezes, são vistos pelo estereótipo do “herói”. Pessoas fortes, quase invencíveis. Pessoas, muitas vezes, duras, corajosas, inquebráveis. E, muitas vezes, esquece-se que esses homens e mulheres são, sobretudo, pessoas. Seres humanos.

Em 2019, um estudo realizado pela Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) apontou que se a Polícia Federal fosse um país, estaria entre as nações com maior índice de suicídio do mundo. Seria o sétimo país em número de suicídios em relação à sua população total.

“É importantíssima essa discussão, esse chamamento no mês de setembro para a prevenção do suicídio. Temos que deixar enfrentar esse tema, superar o tabu, identificando sinais, ofertar ajuda a essas pessoas. O mais importante é mostrar que tem solução, que as pessoas podem procurar ajuda e que ela é necessária para sair desse quadro. A Polícia Federal tem um alto índice de suicídio, por ser uma profissão muito estressante. Estamos promovendo esse assunto sempre e estamos à disposição para ajudar”, afirmou o presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Espírito Santo (Sinpef-ES), Marcus Firme.

Assistente social da Polícia Federal e mestranda em Segurança Pública, Gegliola Campos da Silva estuda o adoecimento mental e o suicídio entre membros das forças de segurança. Segundo ela, o tema ainda é tratado como tabu e é preciso falar, esclarecer, explicar cada vez mais para que, quando um agente necessita, ele busque ajuda.

Na entrevista abaixo, ela destaca que “as instituições de segurança pública precisam admitir que o adoecimento mental faz parte de uma profissão de risco e implementar ações para diminuir os impactos psicossociais do trabalho”.

Quais os impactos do adoecimento mental nas forças de segurança?

Gegliola Campos: O adoecimento mental na forças de segurança é uma questão que precisa ser tratada sem estigma e com informação, afinal, os impactos são imensuráveis uma vez que operadores da segurança pública já vivenciam o risco da profissão e precisam estar emocionalmente saudáveis para garantir a segurança pública com excelência e desempenhar seu papel com eficácia.

Como o suicídio de um colega afeta a corporação?

Gegliola Campos: Às vezes o suicídio de um colega gera mais impacto do que a morte por conta do trabalho policial, e, em algumas pessoas, pode ser gatilho para o sofrimento mental ou até causar o efeito contágio, chamado pela literatura especializada de “Efeito Werther”, por isso, além das ações de prevenção são também fundamentais as ações de “pósvenção” ao suicídio, que é o cuidado com as pessoas enlutadas ou impactadas.

O índice de suicídio entre agentes é mais alto do que na população em geral? Por quê?

Gegliola Campos: Apesar das estatísticas alarmantes sobre a alta incidência de suicídio entre policiais, que são apontados pela literatura como um grupo de alto índice de suicídio, pela natureza do trabalho, pelo acesso a meios letais, pelo contato cotidiano com várias formas de violência, não se sabe até que ponto é possível afirmar que policiais se matam mais do que outras categorias profissionais.

Os dados são precários, a subnotificação é grande, e, essa questão é ainda uma incógnita para os especialistas no tema, e que no Brasil é objeto de pesquisa e monitoramento da Dra. Dayse Miranda, a referência acadêmica na discussão sobre o porquê policiais se matam, segundo a pesquisadora, os estudos epidemiológicos sustentam que a taxa de suicídio entre policiais é superior à média da população, mas as possíveis determinações dessa questão ainda precisam ser aprofundadas.

Que ações podem ser implementadas para reduzir o risco de suicídio em agentes de polícia?

As instituições de segurança pública precisam admitir que o adoecimento mental faz parte de uma profissão de risco e implementar ações para diminuir os impactos psicossociais do trabalho, mesmo sabendo que o suicídio é multicausal, é possível diminuir possíveis “gatilhos” para tal fenômeno.

Neste sentido, algumas ações podem ser implementadas no contexto da segurança pública tais como: promover desde os cursos de formação a consciência para o autocuidado em saúde mental; incluir a atenção psicossocial institucionalizada na rotina de trabalho; fortalecer a rede de apoio e de preocupação mútua no espaço de trabalho; capacitar gestores em temáticas sobre liderança positiva e processo decisório humanizado; capacitação continuada em temas relacionados a saúde mental; programas de promoção a qualidade de vida no trabalho; combater toda a forma de assédio e de abuso, etc.