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A traficante que virou amiga do PF: conheça algumas das histórias do agente Marcelo Thompson

Há 3 anos

Autor:Marcus Vieira

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Bem perto de completar seus 63 anos de idade ele já pode dizer que, praticamente, metade desse tempo passou vestindo o uniforme da Polícia Federal.

Marcelo Thompson é o segundo entrevistado da série de reportagens “Resgatando nossa história” e se empolga, até hoje, de lembrar momentos dos 32 anos na corporação, em que ingressou em 7 de julho de 1981.

O filho de operário, nascido e criado em Cachoeiro de Itapemirim (ES), começou sua carreira na Divisão da PF em Ilhéus (BA), onde ficou durante cinco anos. O jovem agente veio depois para Vitória e vivenciou aqui momentos difíceis, em que o Estado foi palco da atuação do crime organizado enraizado dentro do aparato policial do Estado.

Entre 87 e 90, a Polícia Federal liderou as operações de combate àquelas organizações criminosas que tinham ligação com o jogo do bicho e também grupos de extermínio, como a conhecida Escuderia Le Cocq.

Antes de chegar ao setor de combate a entorpecentes, Thompson atuou durante certo período na Delegacia de Imigração e não consegue esquecer as tristes histórias que testemunhou durante investigações de adoções internacionais. Era comum a vinda de estrangeiros para adotar crianças, mas que fugiam ao controle da Justiça Estadual e Federal, ao passo que as famílias praticamente realizavam a “venda” de seus filhos.

“Eram histórias tristes de se ver. Certa vez, eu estava no balcão da imigração do aeroporto e recebi um religioso italiano, que tinha uma ordem judicial de adoção de dois irmãos. Ele me entregou o passaporte dele com UU$ 200 dólares dentro. Eu rejeitei algumas vezes a oferta e, ao final, ele desistiu da tentativa. Passados alguns meses, como de praxe, fomos fazer a investigação da adoção e descobrimos que os pais tinham recebido alguns bens, uma reforma da casa em Santa Teresa e, mesmo arrependidos de terem cedido os filhos, não conseguiram encontrar os dois meninos”.

A partir de 97 Thompson retornaria para a Divisão de Combate a Entorpecentes, sua especialidade. Para ele, esse é um dos núcleos mais especializados dentro da Polícia, já que a atuação exige muito, em operações específicas, em que é necessária a experiência e um bom feeling de perceber certos indícios que são percebidos ali no ato de uma abordagem.

Ao analisar o período próximo à sua aposentadoria, Thompson relembra que: “em 2013, quando voltei de um trabalho no Centro-Oeste durante alguns meses, percebi que o estilo de atuação estava mudando no setor de entorpecentes. Ali, percebi que não me encaixaria mais naquilo e comecei a preparar a minha aposentadoria”, comentou.


Como enxerga o trabalho realizado hoje


“Não concordo com a forma como vejo a corporação hoje se dedicando intensamente aos alvos ligados ao tráfico internacional de drogas. Ou seja, ao que sai do País para outras nações. O que afeta o nosso dia a dia aqui é a droga que circula internamente, em carros, ônibus interestaduais e até trens, alimentando as facções que estão nas periferias das cidades”.

A vida pós PF


A minha saída da PF veio em boa hora, porque me ajudou a estar mais presente na vida familiar, cuidar mais da saúde. Com 40 anos de casado, tenho três filhos e, um deles, é policial militar.

Voltei também a estudar e me formei em Administração. Recentemente, terminei uma pós-graduação na área de Ciências Penais, além de ter montado um negócio próprio na área de investigação em processos trabalhistas, contraprova processual e fraudes de licenças trabalhistas.


Histórias


Uma história engraçada e surpreendente da minha época na Polícia foi de uma mulher que fazia tráfico de drogas aqui no Estado e que acabamos atuando na prisão dela algumas vezes e ela acabava sendo solta ou fugia do presídio.

Depois de um tempo ela já me reconhecia, conversava comigo e eu até tentei aconselhá-la algumas vezes. Alguns anos depois, ela me viu na rua, veio correndo e disse que queria ir na delegacia conversar comigo e os demais colegas.

Pois ela esteve lá, disse que estava mudando de vida, pediu desculpas pelo que fez e me agradeceu pelos conselhos. Dali em diante tornou- se amiga da minha família, agora mora no interior do Estado e mantém algum contato conosco até hoje.